segunda-feira, 27 de maio de 2013

Não te cales, Joaquinzão

Não te cales, Joaquinzão
Luiz Inácio Lula da Silva é como seu time de coração: ou é demasiadamente amado ou odiado. Exagero é um erro proporcional de qualquer lado. Como todo mundo, seus acertos deveriam ser reconhecidos, enaltecidos e apoiados, e seus erros reprovados e apenados, quando necessários. Mas um dos seus acertos foi a alardeada escolha de um negro para a Suprema Corte de Justiça desse país, o que nunca tinha ocorrido antes na sua história. Pena que foi um caso isolado e que tenha sido colocada como um gesto de benevolência.
Joaquim Barbosa sempre fez jus a sua indicação. Primeiro, não reforça gratidão por ter sido um negro escolhido ministro; ao contrário, se posiciona como um conhecedor profundo da judicatura e das suas atribuições. Mas não é pelo conhecimento jurídico e pela sua cultura incontestáveis que ele se destaca. É acima de tudo pela coragem como vem apontando e tentando combater as mazelas do Poder Judiciário e dos demais Poderes.
Numa palestra recente no Instituto de Educação Superior de Brasília, ele disse que os partidos políticos são de mentirinha, que as pessoas não se identificam com eles e que o Congresso Nacional é ineficiente e totalmente dominado pelo Executivo. Não é de hoje que nada disso é novidade para ninguém. A recente aprovação da Medida Provisória dos Portos mostra que o Congresso se tornou um órgão chancelador do que interessa ao Planalto, com a contraproposta de emendas aprovadas, cuja aplicação deveriam ser melhor acompanhadas pelos órgãos de fiscalização.
Quanto à falta de identidade das pessoas é de uma obviedade ululante. Ninguém sabe para que serve um partido, a não ser indicar seus "proprietários" a cargos eletivos. Muitos integrantes nem sequer sabem que estão filiados. Nenhuma agremiação tem qualquer atividade fática, nem difunde suas ideologias, uma vez que estas definitivamente não existem. A indicação do vice-governador da oposição como ministro da situação aponta o tamanho do comprometimento ideológico predominante, tanto da oposição quanto do governo.
Houve reações veementes no sentido de que essas manifestações não contribuem para a democracia; outras apontando que o ilustre ministro não está à altura do cargo. Ora, essa gente está acostumada a confrarias interesseiras e a um convívio hierárquico, onde a presidenta da República está acima dos presidentes dos demais poderes. O ministro prefere exercer sua presidência de forma independente.
Muitos apostam num ministro encolhido, pois afinal é negro e veio de uma família pobre. Joaquim Barbosa sabe que não conseguiu nada de favor de ninguém, nem mesmo da sociedade. Se ele deve a alguém é somente aos seus pais, que além de uma educação formal adequada, lhe ensinaram valores acima disso, principalmente o de não se curvar a ninguém, nem mesmo perante uma casta de privilegiados que não está acostumada com quem tem autonomia para falar sem receios.
Só não pegou bem para a assessoria do Supremo Tribunal Federal tentar amenizar as críticas do ministro ao afirmar que não tinha a intenção de ofender o Congresso. Ninguém tem o poder de evitar que alguém vista a carapuça. A democracia tem defeito e a nossa tem um por princípio: o voto, seu principal instrumento, ainda é obrigatório.
Ministro Joaquim Barbosa: seu passado, sua luta, sua integridade pessoal, seu conhecimento jurídico, sua capacidade de gestor, em resumo, sua biografia não permite se curvar a ninguém neste país. A sociedade está com Vossa Excelência. Não te cales, Joaquinzão!

Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP
    Bacharel em direito

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Nossos vícios no futebol


Nossos vícios no futebol
Não conheço a fundo outros povos para dizer que somente o brasileiro seja um povo que costuma alimentar e perpetuar os vícios que cria. Vira e mexe falo disso e associo ao futebol por ser uma das representações maiores da nossa gente.
Durante três décadas, os times brasileiros venceram apenas cinco taças da Libertadores das Américas. Duas nos anos sessentas e, respectivamente, uma e duas nas décadas seguintes. O nosso argumento era que o brasileiro não valorizava o campeonato. O inverso do mesmo argumento é utilizado para criticar, mesmo que sutilmente, os europeus por não valorizarem abertamente o Mundial de Clubes.
Olha que existe uma grande diferença. Nesse formato de torneio, o time mais expressivo que os europeus enfrentam é o campeão sul-americano, geralmente na final. Ou seja, deveríamos reconhecer a lógica de uma oitava de final entre os grandes europeus ser muito mais relevante do que uma final com um time asiático, africano ou até das Américas.
Por aqui, os narradores e comentaristas esportivos indistintamente passam o jogo inteiro criticando e até instigando quem os ouça a se insurgir contra os árbitros em razão dos erros cometidos contra equipes brasileiras. Quando o mesmo erro favorece às equipes daqui, eles são bem amenos nas críticas e o máximo que dizem é que o time brasileiro não tem nada a ver com a falha da arbitragem. Tá bom. Esse conceito só vale para o Brasil!
Outra mania é os comentaristas mencionarem como os treinadores deveriam jogar. Aí são sempre as alternativas para vencer de um lado e do outro, como numa partida só um vence, nunca dizem qual é efetivamente a sugestão para valer.
Certa vez contestei as "sobras" de Falcão. Ele insistia em dizer que sobrariam três daqui, dois para acolá. Até que eu persuadir para que ele explicasse a razão de tanta sobra, vez que cada time entra com o mesmo número de jogadores, no mesmo espaço e quando sobram três de um lado, necessariamente existe a mesma quantidade livre do outro, salvo caso de expulsão ou jogador que sai contundido sem possibilidade de substituição. No mínimo deveria dizer qual das sobras era mais importante.
Outro hábito é dizer que houve falha individual ou coletiva quando o time toma um gol. Sem considerar a superioridade do ataque, todo gol forçosamente ocorre por falha. Técnico que substitui bem. Só acho que substitui bem quem escala mal. Não vislumbro outra explicação lógica alguém deixar melhor, o mais bem preparado para depois, quando o time fica em desvantagem, visto que o único motivo de mudança de um técnico brasileiro é o resultado. Nenhum altera para ampliação do resultado, por mais que o jogo esteja propício a isso.
Mas persistem outras coisas ilógicas. O gol na casa do adversário valer mais serve como incentivo e reconhecimento na interferência dos fatores extracampos; e ainda piora o fato dessa regra não servir para as finais. O mesmo se aplica para as vitórias por mais de dois gols fora de casa eliminarem a partida de volta nas duas primeiras fases da Copa do Brasil. Isso se assemelha às vitórias de três pontos antigamente, com a ressalva de que valiam para os jogos em casa ou fora.
Quando o time faz um, dois ou três gols, mesmo o adversário não oferecendo resistência, o recuo tem sido inevitável. Com isso, as grandes goleadas passaram a ser uma espécie em extinção. E, ainda, qualquer drible, jogada de efeito ser considerada desprezo ao adversário.
O circo se fecha com a não comemoração pelos gols contra equipes onde o atleta jogou alguns dias, sem nenhuma história marcante; o árbitro nunca apresenta o segundo cartão amarelo para o goleiro que faz "cera", além de os brasileiros considerarem falta qualquer contato no adversário, mesmo quando é este quem se atira sobre o outro, como se fosse dever do adversário abrir o caminho. Outras manias serão abordadas futuramente.

Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP
    Bacharel em direito

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Anos de dor


Anos de dor
Fatos escabrosos sobre o caos da saúde pública brasileira não deveriam chocar a mais ninguém devido à repetição diária e generalizada. Mesmo com tantas ocorrências, alguns chocam não pelo fato em si, mas pelo tempo de duração.
Aconteceu recentemente em Sorocaba, no interior de São Paulo, um daqueles que assustam e mexe com a sensibilidade de qualquer pessoa. Rosmari Aparecida Rosa, de 53 anos retirou um pedaço de faca do corpo após 37 anos de um sofrimento insuportável.
Destaca-se nesse episódio o fato de uma radiografia simples ser de rápida solução, mas nenhum médico, nenhum hospital, nenhum envolvido seja público ou particular tomou essa iniciativa elementar antes. Essa mulher deve ter passado por diversos médicos, postos e hospitais várias vezes.
Outro ponto que não se ouviu falar é se as secretarias municipal ou estadual da saúde deram início a algum procedimento administrativo para averiguar por quais órgãos públicos com vista à apuração de responsabilidade e a respectiva punição. Não resta nenhuma dúvida que houve negligência e imperícia. Por mais primários que sejam os atendimentos, devem ter registros documentados de suas passagens.
Repito, caso ela tenha sido atendida por órgãos públicos, o que é muito provável devido à duração do problema, já que se ela tivesse melhores condições financeiras teria recorrido a hospitais particulares que, por mais simples que fossem já teriam realizado radiografias, alguma tomografia e até ressonância magnética.
Mas esta seria apenas a primeira fase de uma administração pública que tivesse um mínimo de seriedade perante seus cidadãos. Por iniciativa própria, a segunda etapa seria indenizá-la pelo flagelo que passou por tanto tempo, em razão única e exclusivamente de descaso. À parte a dignidade escamoteada pelo padecimento de quase quatro décadas, imagine quanto essa senhora não deixou de realizar, de produzir e de desfrutar da vida.
Em última instância, ela deveria requerer aposentadoria, com base num salário médio hipotético do que receberia durante os 35 anos que poderia ter contribuído e não o fez porque ficou impossibilitada devido à ineficiência e omissão estatais.
Nessas horas, em vez de medidas adequadas, os agentes públicos esmeram-se em dar explicações do que só a eles convencem. Como o poder público no Brasil só tem o propósito de se beneficiar do povo e não tomará nenhuma das medidas sugeridas, a senhora e seus familiares deveriam pleitear tanto a indenização quanto a sua aposentadoria. Devem procurar um promotor de justiça para auxiliá-la na promoção das ações cabíveis.
Esse é daqueles casos de danos irreparáveis. Para esses casos não existe justiça; pode haver reparações de alguns danos. Essa senhora não pode se satisfazer só em ter encontrado um "anjo", o doutor Walberto Kushiyama, que solicitou uma ressonância magnética, elementar, que nenhum outro profissional fez em 37 anos.

Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP
     Bacharel em direito

sábado, 11 de maio de 2013

Cigarro e bebida


Cigarro e bebida

Titularia este artigo com a famosa frase “é proibido proibir”. Ninguém esquece Caetano Veloso vociferando-se contra essa rotina do período da ditadura militar no Brasil.Pois, hoje, o Planeta repete contra os fumantes.
Pode ser uma luta justa, mas peca pelo exagero, pois proibir atos individuais tornou-se uma mania mundial, em especial no Brasil. Quanto às ações contra os fumantes, o erro está em querer proibir o cidadão de fumar. O correto é proibi-lo de fazer mal aos outros. Mas a questão principal seria a diferença de tratamento entre fumante e beberrão. E ambos trazem problemas, mas os da bebida parecem ser mais amplos e com menores chances de defesa pelas vítimas. No entanto, a bebida recebe tratamento de muito glamour e alguns alertas tímidos e dissimulados.
Sempre vem o estímulo gigante e depois uma frase tímida, quase inaudível, a recomendar se quiser beber não dirija. Como se o mal estivesse só em dirigir. Quem fuma, prejudica com o cheiro da fumaça; quem bebe, com o da bebida. Quem fuma pode prejudicar o outro com o ardor nos olhos; quem bebe, com as cusparadas indesejadas.
O fumante suja a cidade com suas pontas de cigarro, facilmente evitada se utilizasse cinzeiro portátil ou jogasse no lugar devido; quem bebe, fala alto, vomita em qualquer lugar sendo uma reação orgânica sem controle. 
O fumante fica consciente; já o embriagado perde quase sempre a consciência. Em grande parte, fumar só prejudica o próprio indivíduo. Ninguém pode evitar o suicídio desejado de ninguém. Mas, quem não quer receber a fumaça afasta-se, ao menos tem essa chance. Já do bêbado é difícil se defender. Ele vem pra cima de qualquer um, ofende, provoca, agride. Em casa, geralmente aterroriza os familiares. E ambos matam milhões ao ano. O cigarro, pelas doenças que provoca. E os bêbados, pelos acidentes que causam. São centenas de casos de assassinatos coletivos em função de acidentes provocados pela bebedeira. Todos docilmente tratados como crime culposo, sem nenhum assassino na cadeia.
Ninguém consegue se defender de uma carreta dirigida por um bêbado. A violência sempre o rodeia. É só levantar as estatísticas de assassinatos decorrentes de embriaguez. Bebida causa um mal muito mais quantitativo e imediato além de não sofrer crítica veemente nem repreensão rigorosa pelas autoridades. E ainda é glamourizada nas novelas, nos filmes, nos comerciais, enquanto só cresce o cerco ao cigarro.
A onda proibitiva de atos que dizem respeito só ao indivíduo, as cantinas das escolas de São Paulo não podem vender salgadinhos, além de outras guloseimas. Alimentar-se corretamente tem que vir da educação de cada um, não pela imposição estatal. Às autoridades caberia sempre a orientação informativa, com vista a educar. Nada mais. E é preciso dar tratamento à bebida semelhante ao dado ao cigarro. Tal como as imagens fortes nos maços de cigarro, nas garrafas de bebida deveriam vir estampadas com imagens de pessoas amassadas ou decapitadas nos acidentes automobilísticos.

Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP
   Bel. direito

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Afronta à Justiça


Afronta à Justiça

Mesmo sem nenhum resultado efetivo, após a condenação dos mensaleiros, o Supremo Tribunal Federal vem sofrendo seguidas retaliações do Congresso Nacional. As mais recentes são a ameaça de acabar com a atribuição de investigações do Ministério Público e a avocação da competência jurisdicional para que o Congresso dê a última palavra sobre matérias constitucionais.
Alegam os “golpistas democráticos” que os congressistas são os legítimos representantes do povo. Em razão das distorções no processo eleitoral brasileiro, só muito ingênuo pode acreditar nessa teoria. O cidadão comum não tem nenhuma participação fora das eleições e toda sua atividade político-partidária fica limitada à obrigação de apertar tecla no dia da eleição.
Além de essa alegada legitimação ser meramente presumida, o histórico de malfeitorias do Congresso Nacional e sua inteira sujeição aos desígnios do Poder Executivo desautorizam ainda mais essa tentativa aloprada de incorporarem o Poder Judiciário. Nessa linha, o Brasil retroagiria vários séculos, deixaria de ter a tripartição dos poderes e passaria a ser um estado totalitário, já que o Poder Legislativo, por sua atuação ultimamente, passou a ser um órgão a referendar atos do Executivo nacional.
Mencionar alguns fatos é necessário apenas devido à memória curta da nossa sociedade para se lembrar de situações desabonadoras. Nenhum brasileiro se sente representado por alguém que concede viagens pagas com dinheiro público para parentes e amigos voarem, para pagar noitadas em motéis com os tais cartões corporativos, que até hoje não se sabe como se gasta esse dinheiro. Vai além disso. É acintoso custear os congressistas e arcar com despesas de mordomias de toda ordem, como pagar moradia até para deputados residentes em Brasília e com cotas de Correio, quando se vive num mundo conectado pela internet.
Com essas figuras na direção, este país nunca atingirá um patamar civilizado, capaz de punir um ato criminoso de alguém, independe do cargo que ocupe.
Pelos antecedentes, pelo passado sombrio de sujeiras de alguns deputados e senadores e dos presidentes das duas Casas recentemente, pela falta de capacidade técnica e até por serem legitimados apenas presumidamente, quem pretende acabar com a atribuição de investigar do Ministério Público, bem como incorporar o Poder Judiciário ao Congresso só o faz em defesa própria ou porque pirou de vez.
Voltar ao estado feudal é um caminho sempre perseguido por alguns, mas a sociedade precisa deixar claro que os representantes fazem o que os representados desejam. Muito embora seja praticada em larga escala e nunca tenha sido evitada, a impunidade é algo que o brasileiro definitivamente nunca quis, muito menos agora.

Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP
   Bacharel em direito