quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Versões e fatos

Versões e fatos

Qualquer cidadão tem um amigo ou algum conhecido que fala mais do que o necessário. Essas pessoas inventam histórias e aumentam outras.
Todo fato de grande repercussão constitui-se de várias versões e de diversas verdades, além de não existir quem na face da Terra não tenha presenciado. A decisão da Copa do Mundo de futebol de 1950 é seu exemplo máximo. São comuns livros alegarem trazer a única verdade sobre determinado fato. Muitos desses livros vêm depois de outros que já assumiam exclusividade sobre a versão verdadeira.
Na política, as várias versões são metodicamente criadas, de forma proposital, para confundirem a única verdade dos fatos. Nessas, o exagero é a regra, principalmente na dissimulação por partes dos protagonistas. Alguns exemplos são corriqueiros. Os pré candidatos a cargos eletivos sempre negam que serão candidatos; quando eleitos, eles afirmam categoricamente que cumprirão seus mandatos por inteiro. Antonio Palocci, sempre ele; e José Serra, político desde sempre, vão além, assinam e registram em cartório.
Artistas e jogadores também aumentam o leque de negações afirmativas. No início da carreira tomam a frente das câmeras, aparecem na noite agarrados com “amigos”, avisam a imprensa de todos os eventos, mas a cara de espanto vem seguida da pergunta de como foram descobertos. Quando vem a fama, pisoteiam os mesmos que antes não conseguiam desviar as câmeras. Na camada social dos comuns, também existem esses disfarces. Os aniversários surpresas só não são para os espantados aniversariantes.
São situações chatas, mas nem sempre trazem prejuízo real à sociedade. Já quando se trata de ação governamental negada, os resultados são catastróficos.
Há anos, no Rio de Janeiro, comunidades inteiras faziam o quê, como e quando os chefes do tráfico determinassem. Era a própria sobrevivência em jogo. Ainda existem lugares onde os entes públicos não adentram há muitas décadas. Assim como todo o Brasil sabia, todas as autoridades responsáveis negavam. Então, vieram a implantação das Unidades de Polícia Pacificadora – UPPs. Quando o território é retomado pelo Estado, o símbolo maior é o hasteamento das bandeiras do Brasil e do estado do Rio de Janeiro. Não existe prova maior da existência de nichos nacionais com soberania comunitária. Apesar da negativa das autoridades, os fatos nunca perdoaram nem perdoam as falsas versões, embora a imprensa brasileira se recuse a mostrar a voz da autoridade negando e depois se vangloriando da bandeira a tremular no alto do morro.


Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP
Bacharel em direito

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Natal sem fome...

Natal sem fome


De novo a história se repete e muitas campanhas começam a ser desencadeadas contra a fome no dia de Natal.
Todos sabem que essa superação visa a dar comida a quem passa fome o ano inteiro, principalmente crianças. Elas são felizardas por conseguirem alcançar as benesses desse período, enquanto muitas morreram vencidas fatalmente pela fome.
Em virtude de um vício nacional de só combaterem os problemas depois de se tornarem crônicos, caberia algumas observações, sem nenhuma reprovação a essas iniciativas. Primeiro seria o fato da prestação de contas se restringir somente ao montante arrecadado, sem detalhar a relação receita verso despesa. No máximo apresentam alguns projetos ou instituições beneficiados, sem mencionar com quanto.
Mais grave, entretanto, seria nunca haver prestação de contas do valor total arrecadado com as campanhas. Este nunca é citado. Claro que se tal campanha arrecada 10 milhões, todo o valor deve ser empregado para a finalidade específica, descontados eventuais impostos, por vir o dinheiro da população.
Não se sabe de alguém conhecedor dessa prestação de contas integral. Apenas exemplos não justificariam. A prestação de contas completa e detalhada traria maior credibilidade às iniciativas.
Por serem apenas sazonais, elas retiram o debate e as ações concretas com vista a erradicar a fome por todo o ano em todo o planeta. As campanhas ajudam, mas devem ser tratados pelo que são; meros paliativos.
Todos devem colaborar nos natais. Se isso, entretanto, for apenas para deixar aliviados alguns corações, achando que já fizeram a sua parte o bastante, ao invés de ser um bem, torna-se um mal gigantesco. Nenhum organismo é moldado a só ter necessidade de comida nos fins de ano. A fome não pode permanecer insolúvel o tempo todo, acobertada por uma cortina de campanhas em datas históricas ou depois de catástrofes.
Natal sem fome é bom, desde que não seja instrumento para camuflar eternamente uma Nação comendo apenas nos fins de ano e passando a vida inteira com fome e indigência.
Muita gente já penou depois deste texto, escrito no Natal de 2001. Como eu havia dito naquela oportunidade, muitas pessoas vão comer bem neste Natal, com a triste certeza de que passarão fome durante o próximo inteiro; sem levar em conta de quem seja a culpa, este mundo só será minimamente justo quando todos tiverem a oportunidade de comer normalmente, sem fome prolongada de pessoas, famílias e nações. O ideal não é um Natal, mas um mundo sem fome.


Pedro Cardoso da Costa/SP
Bel. Direito

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Tietê

Tietê, que te quero limpo

Quando surgiram as campanhas de despoluição do rio Tietê na década de 90, mais precisamente em 1992, gerava grande preocupação e desilusão nos mais céticos quando era citado o longo prazo para que o rio tivesse oxigênio e voltasse a ter vida, com peixes e pescadores, prática de esporte e lazer, arborização em toda a sua extensão e até servir como meio de transporte coletivo.
Era citado o tempo gasto no processo de despoluição de rios em outros países, com destaque para o rio Sena, na França e o Tâmisa, na Inglaterra. Este teria levado trinta anos para ser despoluído totalmente.
Silenciada durante os 18 anos que se passaram no processo de limpeza do rio, no dia 6 de novembro de 2011, na capa da Folha de São Paulo há a noticia impactante do gasto de quase 2 bilhões de dólares para a poluição piorar um “pouco”.
Nesse período já passaram seis governadores pelo Palácio dos Bandeirantes, iniciado com Luiz Antonio Fleury Filho; seguido por Mário Covas, Geraldo Alckmin, Cláudio Lembo, José Serra e Alberto Goldman que formaram o grupo de governadores no processo de “deslimpeza” do rio Tietê. Mario Covas por dois mandatos e Alckmin, já no terceiro, são responsáveis pelo período de 14 anos pela limpeza que suja. E o Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB é o inegável pai da criança até a maioridade alcançada no final de 2010. Esse é o número de responsáveis diretos, mas os bilhões desperdiçados impressionam mais.
Um dos diretores de projetos da Sabesp, órgão responsável pelo que seria despoluição, Carlos Eduardo Carrella, regojiza-se ao afirmar que “se nada tivesse sido feito a situação seria bem pior”, argumento semelhante a outro muito utilizado no passado pelos ministros de economia para minimizar os efeitos deletérios da inflação. Diziam que a inflação de determinado mês não fora tão alta como era esperada, pois ficara em 50%, quando as previsões apontavam 80, 90% para aquele mês.
Ao contrário de autoridades de países desenvolvidos, as brasileiras costumam justificar qualquer coisa, por mais absurda que seja; não assumem seus erros. O gasto astronômico sem resultado careceria de investigação mais aprofundada, mais séria do que costuma ser em casos semelhantes. E já deveria ter sido antes de se chegar a gigantesco desperdício de dinheiro público. O diagnóstico de onde vem a sujeira já existe. Então, seriam necessárias algumas alterações em diversas ações e intensificação do trabalho noutras. Fiscalizar e exigir que as residências façam a adequação de seus esgotos para a rede, caso exista, ou para fossas. As indústrias e casas comerciais só deveriam receber a licença de funcionamento após comprovar a destinação adequada do seu esgoto e seu lixo. Aplicar multas desde pedestre que jogasse palito de fósforo, ponta de cigarro nas ruas até quem jogue sofás e material de construção em locais inadequados. Leis já existem em São Paulo. Falta só o cumprimento.
Como Lula, se o rio estivesse limpo, cada governador diria que ninguém nunca na história deste país teria feito tanto pelo rio, numa busca pelo título de limpador-mor do Tietê. É possível ter havido projeto básico resultante de profundo estudo; projeto de execução; definição de resultado por etapas. Nenhum maluco poderia imaginar todo esse trabalho realizado propositalmente para aumentar “satisfatoriamente” a poluição. Alguém tem que vir a público dizer onde existiram falhas gravíssimas e grosseiras para se chegar a resultado tão bisonho. Não se tem como negar a paternidade ao PSDB e a criação até a presente data. Também falhou a imprensa por não ter acompanhado de perto com cobranças periódicas de resultados. Cada governador teria que explicar quanto gastou e seu percentual de piora.
Nenhum argumento justificaria minimamente esse desastre. Apurar e punir os responsáveis seriam dever, mas não resolvem o que já deixou de ser feito. Servem de alerta para acabar com a política de gastar bilhões de dólares para piorar gradativamente um serviço público tão relevante. Com seguimento da política atual de despoluição, daqui a 80 anos 10 bilhões de dólares terão sido literalmente enterrados num rio acabado.


Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP
Bacharel em direito