segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

A gente tem sede de quê?


A gente tem sede de quê?

Quando surge um problema na vida de um cidadão, a primeira coisa que ele tenta é resolver. Quando esse problema surge na esfera da administração pública, a autoridade busca logo uma desculpa e as justificativas, que explicam, mas não justificam.
Neste momento a discussão quase exclusiva gira em torno da falta de água e, por consequência, de energia, que não é somente por falta d’água que têm seus constantes apagões.
Nas crises aparecem sempre os “especialistas” a dizer sempre o que deveria ter sido feito, mas que não disseram a tempo de evitar os problemas. Eles se juntam às autoridades responsáveis para atribuir a culpa às vítimas, assim como na violência, na péssima qualidade do ensino e em todas as deficiências dos serviços públicos.
O cidadão é culpado porque lava a calçada, o carro; porque lava a roupa e a louça aos poucos e não de uma vez. Só faltam dizer que ele bebe água acima do recomendado pela Organização Mundial da Saúde. Esse descuido até deve ser real e lógico. O problema é que nunca disseram uma vírgula antes para a pessoa adquirir hábito de maneira natural e cotidiana.
O fornecimento de água, assim como o de energia se dá por contrato de adesão entre empresa fornecedora e o cliente. Como todo negócio de compra e venda, sem crise, o vendedor quer vender o máximo e o consumidor é incentivado a consumir o quanto mais.
Ninguém diz que nenhuma crise começa como a explosão de uma bolha. Ela vai se constituindo vagarosamente. A imprensa e seus especialistas deveriam afirmar isso com clareza ululante e quais as medidas deveriam ser tomadas para não faltar água. É importante que se saiba que a água deve ser adequadamente utilizada, mas cada um deve consumir conforme a sua necessidade, que é diferente de uma pessoa para outra.
É fundamental saber que não há nenhuma definição do que seria abuso. E essa culpabilidade recai sempre sobre os pobres, entrevistados constantemente sobre como economizam água. Entretanto, os maiores desperdícios ocorrem nos órgãos públicos. Em nenhum existe algum mecanismo de reúso da água. Agora mesmo, em qualquer repartição coletiva que se vá não tem mictórios para evitar o desperdício com descarga de vários litros toda hora que se fizer xixi.
Em vazamentos são desperdiçados mais de 30% da água tratada na capital paulista, que ainda é uma das cidades que menos desperdiçam no Brasil. Outra crítica recorrente é dirigida às ligações clandestinas. Há uma diferenciação que não é apontada: apenas por ser irregular formalmente não significa água jogada fora. A população pode estar consumindo de forma adequada, mas não paga pelo consumo.
Racionamento passou a ser chamado de diminuição de pressão. Isso significa que a água não chegará aos consumidores, uma tentativa infantil de tentar camuflar uma realidade constatada dia a dia pelos consumidores. Isso significa falta d’água, independente do nome que derem.
Outra distorção perpetrada pelos meios de comunicação é o destaque dado aos altos índices de aprovação popular ao racionamento. Não fazem nem uma analogia ao pedido de Paulo Maluf para que as mulheres fossem “apenas” estupradas e não assassinadas. Precisaria ser de outro planeta - não humano - para escolher ficar sem uma gota a ter um pouco de água.
Caso tivessem um mínimo de decência, as autoridades deveriam pedir desculpas sinceras à população, além de renunciarem aos cargos quando deixassem se instalar uma crise como a atual falta de água e de energia, uma prática recorrente nos países desenvolvidos e nos asiáticos, em especial. Não ficarem brincando como o ministro das Minas e Energia de que Deus é brasileiro. Esqueceu de dizer que parece que o Capeta também é filho nato.

Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP
   Bacharel em direito

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